É tudo verdade 2013: Festival internacional de documentários
O calendário das Mostras e Festivais de Cinema de São Paulo é marcado por uma hipertrofia no 2º semestre do ano e alguns eventos acabam acontecendo em datas coincidentes. Mas no 1º semestre é possível acompanhá-los com mais tranquilidade. Seu maior destaque, É TUDO VERDADE, é voltado exclusivamente para o gênero Documentário e neste ano chega à sua 18ª edição.
A IMPORTÂNCIA DO FESTIVAL
É TUDO VERDADE é um Festival de reconhecimento internacional que integra o circuito dos grandes Festivais mundiais de Documentários. Tal como acontece com o Cinema de Arte, os títulos que apresenta, em sua maioria, não costumam ser exibidos nos cinemas comerciais do Brasil nem são disponibilizados para compra em dvd. Alguns documentários longa-metragem nacionais podem entrar em cartaz, mas demoram até 3 anos para isso. Já os filmes estrangeiros não têm a mesma sorte: dos 54 títulos (entre curtas, médias e longas) exibidos no É TUDO VERDADE de 2012, nenhum entrou em cartaz ou foi lançado em dvd!
Esse Festival é, portanto, uma oportunidade mais do que rara para nos sintonizarmos com algumas das melhores produções mundiais do gênero. Ou, então, ficarmos à mercê do que nos é oferecido: DE PERNAS PARA O AR PARTE 2, XUXA E O XEUX XINCUENTA ANOX, AS AVENTURAS DE DIDI PARTE MIL CENTO E SETENTA E TRÊS…
TEMÁTICAS e CATEGORIAS
Sob a curadoria do crítico Amir Labaki (autor de uma coluna semanal no caderno EU & FIM DE SEMANA, às sextas-feiras, no jornal VALOR ECONÔMICO), o Festival É TUDO VERDADE (18ª edição) é uma vitrine de algumas das melhores produções internacionais e dos lançamentos nacionais. O leque temático é sempre bastante amplo, mas as produções voltadas para temas políticos predominam, como a programação desse ano confirma outra vez.
Os 82 filmes de 26 países são organizados em várias categorias:
Competição Internacional: longa ou média-metragem,
Competição Brasileira: longa ou média-metragem,
Competição Internacional: curta-metragem,
Competição Brasileira: curta-metragem,
Programas Especiais:
– Foco Latino-Americano;
– Retrospectiva Internacional;
– Retrospectiva Nacional.
Paralelamente acontecem Conferências, Debates e outras atividades com a presença de diretores, conferencistas e especialistas.
ONDE e QUANDO
As sessões acontecerão nos seguintes locais:
1. CINE LIVRARIA CULTURA SALA 2 (Av. Paulista, esquina com a Rua Augusta, dentro do Conjunto Nacional)
2. RESERVA CULTURAL (Av. Paulista, 900 – Edifício da TV Gazeta)
3. MIS (Av. Europa, 158, continuação da Rua Augusta sentido Jardins)
4. CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (Rua Álvares Penteado, 112 – Centro, o acesso mais fácil é pelo metrô Sé ou São Bento)
5. CINEMATECA BRASILEIRA (Largo Senador Raul Cardoso, s/n – Vila Mariana)
As sessões são todas gratuitas e os ingressos são distribuídos uma hora antes de cada sessão (1 ingresso por pessoa).
As sessões do final da tarde e início da noite na LIVRARIA CULTURA e na RESERVA CULTURAL são concorridíssimas. Chegue com antecedência.
Salvo algum problema técnico de projeção, os filmes começam pontualmente no horário e não é permitida a entrada após o início da sessão.
Se você estiver assistindo a uma sessão e desejar assistir à seguinte no mesmo cinema, pode sair da sala para retirar o ingresso e depois retornar à mesma.
PIPOCA, OUTRAS COMILANÇAS E CELULARES NÃO SÃO BEM-VINDOS!
INÍCIO: a abertura do Festival é 5ª feira (dia 4.abril) em sessão exclusiva para convidados.
Na 6ª estarão disponíveis, nos cinco cinemas onde o evento acontece, os folders com a programação e os horários.
CATÁLOGO (cerca de 150 páginas): nos locais de exibição há um catálogo para consulta com as sinopses de cada filme. Esse catálogo também é vendido (provavelmente apenas no CINE LIVRARIA CULTURA – no cinema, não na livraria – e na RESERVA CULTURAL) e deve custar 5,00 reais.
Cinema documentário. Um diálogo com o mundo e um convite à consciência crítica. Mergulhemos no “estado das coisas”.
A. DESTAQUES DOS FILMES NA COMPETIÇÃO INTERNACIONAL
1. NASCIDO NA URSS – GERAÇÃO DE 28, de Sergei Miroshnichenko (Rússia, Inglaterra, Alemanha, 209 minutos)
Em 1991, 20 crianças de sete anos foram escolhidas na então União Soviética e filmadas continuamente a cada sete anos. O filme acompanha suas transformações pessoais até a idade adulta e as drásticas mudanças econômicas e políticas de uma ex-superpotência que acordou fragmentada.
Quando?
Reserva Cultural: dia 05, 14h00
Livraria Cultura: dia 11, 15h00
2. MINHA REVOLUÇÃO ROUBADA, de Nahid Persson Sarvestani (Suécia, Noruega, Inglaterra e EUA)
O diretor iraniano Nahid Sarvestani, após sofrer perseguições islamitas, vê-se obrigado a abandonar o seu país. Trinta anos depois, parte ao encontro de diversas amigas ativistas que foram presas e torturadas. O filme reconstitui os primeiros anos de um regime altamente repressor.
Quando?
Livraria Cultura: dia 05, 15h00
Reserva Cultural: dia 10, 18h00
3. NOSSO NIXON, de Penny Lane (EUA)
A presidência de Richard Nixon é revisitada a partir de materiais de arquivo inéditos realizados por três de seus assessores. Apreeendidos pelo FBI, depois arquivados e esquecidos por quase 40 anos, estes filmes caseiros mostram fatos históricos e da intimidade do ex-presidente. São testemunhos de um período eufórico e cego à catástrofe iminente que o país enfrentaria.
Quando?
Livraria Cultura:dia 05, 17h00
Reserva Cultural, dia 08, 18h00
4. O UNIVERSO PARTICULAR, de Helene Trestikovo (República Tcheca)
Seguindo uma história pessoal, a diretora constrói uma crônica familiar e um retrato de quatro décadas de transformações da antiga Tchecoslováquia. Episódios históricos dramáticos e as expectativas de cada momento são confrontados com o choque de realidade.
Quando?
Livraria Cultura:dia 09, 17h00
Reserva Cultural, dia 11, 16h00
5. UMA VEZ ENTREI NUM JARDIM, de Avi Mograbi
Reencontrando seu antigo professor de árabe (o palestino Ali Al Azhari), o diretor israelense Avi Mograbi cria o cenário ideal para uma discussão sobre como os persistentes conflitos no Oriente Médio vêm afetando as vidas de todos os moradores da região, independente de qual seja a sua cultura ou religião.
Quando?
Livraria Cultura:dia 12, 17h00
Reserva Cultural, dia 07, 18h00
6. ESTOU NO ESPAÇO, de Dana Ranga (Alemanha)
A partir de entrevistas com astronautas e seus psicólogos e a filmagem do cosmonauta Jean-François Clesvoy, o filme reconstitui a experiência de estar no espaço.
Quando?
Livraria Cultura:dia 05, 17h00
Reserva Cultural, dia 05, 18h00
B. RETROSPECTIVA INTERNACIONAL – CINEMA SOVIÉTICO
Nesse módulo, o É TUDO VERDADE 2013 homenageia o jornalista e cineasta russo Dziga Vertov. Um dos pioneiros do documentário, Vertov produziu dezenas de filmes de propaganda política após a vitória da Revolução de 1917.
Inicialmente, seus filmes foram aclamados; depois, foram acusados de verborragia panfletária. No calor dos acontecimentos, os cidadãos eram enquadrados como trabalhadores ou burgueses. Hoje, essa dicotomia nos soa simplista demais e o distanciamento temporal nos permite uma avaliação mais crítica e menos passional dessas películas.
A Retrospectiva contempla oito títulos de uma produção de difícil acesso. As cópias vieram do Austrian Film Museum, instituição que reúne o mais importante acervo mundial de filmes e documentos relacionados ao diretor. A curadora da coleção, Adelheid Heftber, está no Brasil para acompanhar as exibições e conversar com o público. Os títulos escolhidos são:
1. VERTOV EM CURTAS: DA CINE-SEMANA (KINO-NEDÊLIA, 1918/1919) AO CINE-VERDADE (KINO-PRAVDA, 1922/1928):
Quatro curtas mostram a formação do diretor, de seus primeiros trabalhos em cinejornais aos filmes mais elaborados, os curtas-verdade, construídos geralmente em torno de um tema específico.
Quando?
Cinemateca Brasileira: dia 12, 18h00 (sessão única)
2. CINE-OLHO:
Os dois polos da vida russa pós-1917, a “Nova” Rússia e a “Velha” Rússia. A Rússia registrada “sem atores, sem diretores, sem cenários”.
Quando?
Banco do Brasil: dia 10, 20h00
Cinemateca: dia 12, 20h00
3. A SEXTA PARTE DO MUNDO:
Nove anos após o triunfo da Revolução Bolchevique, uma visão panorâmica do estado das coisas no vasto território da nova URSS.
Quando?
Cinemateca: dia 13, 16h00 (sessão única)
4. O DÉCIMO PRIMEIRO ANO:
Um hino ao primeiro decênio da Revolução de 1917. A celebração do socialismo é mostrada a partir das realizações na Ucrânia, tendo como centro a nova barragem do rio Dniepre.
Quando?
Cinemateca, dia 13, 18h00 (sessão única)
5. O HOMEM DA CÂMERA DE FILMAR:
Um ensaio sobre um dia na vida de uma metrópole soviética, o filme é um elogio à supremacia realista do olho da câmera frente ao olho humano.
Quando?
Banco do Brasil: dia 11, 20h00
Cinemateca: dia 13,20h00
6. ENTUSIASMO:
Em seu primeiro documentário sonoro, Vertov realiza um ensaio sobre o poder do cine-olho e do ouvido-rádio. A base do filme é o empenho dos trabalhadores ucranianos para cumprir o Plano Quinquenal.
Quando?
Banco do Brasil: dia 12, 16h00
Cinemateca: dia 14, 16h00
7. TRÊS CANÇÕES PARA LÊNIN:
Uma ode ao líder soviético no décimo aniversário de sua morte, este filme reúne imagens feitas em vida e no seu funeral. Utiliza também filmagens sobre o impacto do legado de Lênin sobre a vida de milhares de mulheres na URSS e para o desenvolvimento econômico do país.
Quando?
Banco do Brasil: dia 12, 18h00
Cinemateca, dia 14. 18h00
8. CANÇÃO DE NINAR:
Para celebrar o vigésimo aniversário da Revolução, o diretor celebra a mulher e as mães da URSS a partir de uma montagem organizada em torno de canções de ninar que incorporam aspectos do folclore.
Observação: esses filmes foram produzidos nas décadas de 1910 e 1920. São todos em preto e branco e a maioria mudos.
Quando?
Banco do Brasil: dia 12, 20h00
Cinemateca: dia 14, 20h00
C. PROGRAMA ESPECIAL – O GOLPE DE 64
Entre os vários programas especiais, o Festival antecipa as discussões e reflexões sobre os 40 anos do golpe militar no Brasil.
Desse programa interessantíssimo (que merece ser visto na íntegra), destacam-se:
1. OS ANOS JK e JANGO, de Silvio Tendler. O diretor e os produtores Hélio Ferry e Denize Goulart participarão de um debate (“Jango e o Caminho para 64”) com o público.
Quando?
Os anos JK – Banco do Brasil: dia 05, 18h00 e dia 13, 20h00
Cinemateca: dia 09, 20h00
Jango – Banco do Brasil: dia 06, 18h00 e dia 13, 14h00
Cinemateca, dia 10, 20h00
2. O FIM DO ESQUECIMENTO, de Renato Tapajós (Brasil): mostra as ações dos movimentos sociais, de procuradores federais e a mobilização da juventude para pressionar o Estado brasileiro a não esquecer das violências cometidas durante a ditadura militar.
Quando?
Livraria Cultura: dia 09, 19h00
Reserva Cultural: dia 10, 22h00
3. EM BUSCA DE IARA, de Flávio Frederico (Brasil): a vida breve de Iara Iavelberg (1944-1971), que trocou uma confortável vida familiar para engajar-se na luta armada contra a ditadura e tornou-se companheira do ex-capitão do exército Carlos Lamarca.
Quando?
Ambas as sessões no Livraria Cultura: dia 12, 21h00 e dia 13, 13h00
4. PROGRAMA ESPECIAL DO IPES (1962-1964): criado em 1962, no Rio de Janeiro, o IPES (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais) foi o órgão que, com o apoio da CIA, ajudou a articular a deposição de João Goulart (veja a chamada CINEMA ESSENCIAL: O DIA QUE DUROU 21 ANOS neste blog). Produziu centenas de filmes de doutrina política que eram exibidos em bancos, empresas e praças públicas. O É TUDO VERDADE traz uma seleção de sete desses filmes, cada um com cerca de 10 minutos de duração:
Quando?
Ambas as sessões no Banco do Brasil: dia 05, 16h00 e dia 13, 18h00
4.1 O IPES É O SEGUINTE: apresentação das propostas do IPES ao mesmo tempo em que se professa a democracia cristã e o perigo do totalitarismo (comunismo).
4.2 UMA ECONOMIA ESTRANGULADA: um retrato da situação desastrosa da economia brasileira a partir da necessidade de renovação da marinha mercante.
4.3 O BRASIL PRECISA DE VOCÊ: o filme convoca os brasileiros a lutarem contra as supostas demagogia e desordem do governo Goulart.
4.4 CRIANDO HOMENS LIVRES: um libelo a favor de uma educação voltada para o ideário liberal necessário para a formação da cidadania.
4.5 CONCEITO DE EMPRESA: mostra o cenário desastroso da economia, convoca os empresários brasileiros contra a desordem do governo Goulart.
4.6 QUE É DEMOCRACIA: opõe a tradição democrática brasileira ao totalitarismo dos países comunistas do Leste Europeu, convoca os cidadãos a tomarem consciência sobre a desordem pública estabelecida pelo governo Goulart.
4.7 O QUE É O IPES: exposição das propostas do Instituto e a propaganda da democracia cristã contra o comunismo.
D. PROGRAMA ESPECIAL – FILMES VOLTADOS PARA A POLÍTICA E A ECONOMIA
Dos vários títulos centrados na discussão de aspectos relevantes de questões políticas e econômicas, sobressaem-se as seguintes produções:
1. OS GUARDIÕES, de Dror Moreh (Israel, França, Alemanha e Bélgica):
Seis ex-dirigentes da Shin Bet, agência de inteligência e contraterrorismo de Israel, saem do anonimato e discutem abertamente sua atuação clandestina envolvendo tortura, execuções e bombardeios. Estes homens, na meia-idade, acrescentam surpreendentes reflexões em torno da segurança e da paz com os palestinos.
Quando?
Reserva Cultural: dia 07, 22h00
Livraria Cultura: dia 12, 19h00
2. A LEI POR ESSAS BANDAS, de Ra’Anan Alexandrowicz (Israel):
Advogados, juízes e generais que ajudaram a criar e a manter o aparato legal usado na Cisjordânia e na Faixa de Gaza desde a Guerra dos Seis Dias, em 1967, são entrevistados neste documentário que procura inquirir sobre as fronteiras entre a legalidade e a legitimidade.
Quando?
Ambas as sessões na Reserva Cultural: dia 08, 22h00 e dia 11, 20h00
3. PALME, de Kristina Lindstrom e Maud Nycandr (Suécia):
Líder do partido Social-Democrata e duas vezes primeiro ministro da Suécia, Olof Palme foi o político mais conhecido da Suécia. Famoso pela firme oposição ao apartheid sul-africano e à guerra do Vietnã, o que lhe valeu problemas com os EUA, ele ressurge, neste documentário, a partir de filmes inéditos familiares. O material lança luzes sobre as muitas faces de um político brilhante cujo assassinato nunca foi esclarecido.
Quando?
Livraria Cultura: dia 05, 19h00
Reserva Cultural: dia 06, 14h00
4. O COMISSÁRIO, de Pekka Lehto (Finlândia, Grécia):
Retrato de Olli Rehn, Comissário para Assuntos Econômicos e Monetários da União Europeia. Ele é acompanhado ao longo de dois anos, período crítico em que se viu obrigado a enfrentar o agravamento da crise grega e o mergulho da zona do euro na recessão, na primavera de 2010. Abalado pelos desafios, procura alternativas para manter a união do continente.
Quando?
Reserva Cultural: dia 05, 20h00
Banco do Brasil: dia 06, 14h00
5. DINHEIRO À TOA, de Jim Bruce (EUA):
Administradores, economistas, historiadores e investidores debruçam-se sobre o papel que o Federal Reserv (Fed), o banco central dos EUA, desempenhou no desencadeamento da crise global de 2008. Analisam também as possibilidades de que o desastre possa repetir-se em um futuro próximo.
Quando?
Banco do Brasil: dia 05, 14h00
Reserva Cultural: dia 08, 20h00
E. FILMES BRASILEIROS DA COMPETIÇÃO
A seleção de produções brasileiras que irão disputar o prêmio de melhor documentário nacional está marcada pela diversidade temática. Eis alguns títulos:
1. SERRA PELADA – A LENDA DA MONTANHA DE OURO, de Victor Lopes:
O maior garimpo a céu aberto do mundo, no sul do Pará, Serra Pelada tornou-se um lugar lendário e de números hiperbólicos. Calcula-se que, na década de 1980, cerca de 100 mil homens, provenientes de todas as partes do Brasil, afluíram para lá. E o que era uma montanha transformou-se numa enorme cratera, hoje alagada. Em meio a essa transformação, deu-se a extração de 30 toneladas de ouro.
Quando?
Ambas as sessões no Livraria Cultura: dia 09, 21h00 e dia 10, 13h00
2. ANTÁRTICA, de Evaldo Mocarzel:
Consagrado pelos documentários À MARGEM DO LIXO, À MARGEM DA IMAGEM e ROCK BRASÍLIA, entre outros, o diretor carioca parte para outra aventura. Rodado logo depois do incêndio que destruiu a estação brasileira na Antártica, em 2012, o filme acompanha uma expedição científica de geólogos brasileiros pelo Polo Sul. Fugindo da tradicional fórmula de entrevistas, o filme segue a dura rotina dos pesquisadores, ao mesmo tempo em que compartilha rara experiência sensorial.
Quando?
Ambas as sessões no Livraria Cultura, dia 10, 21h00 e dia 11, 13h00
3. PAULO MOURA, de Eduardo Escorel:
O montador e diretor Eduardo Escorel, reconhecido por trabalhos como A ERA VARGAS, entre outros, recolheu durante décadas imagens do clarinetista Paulo Moura, morto em 2010.
Quando?
Livraria Cultura: dia 05, 21h00
Cinemateca: dia 11, 20h00
4. O UNIVERSO GRACILIANO, de Sylvio Back (veja comentário a seguir).
Quando?
Ambas as sessões no Livraria Cultura: dia 11, 21h00 e dia 12, 13h00
5. SOBRE SETE ONDAS VERDES ESPUMANTES, de Bruno Polidoro e Cacá Nazário. Embora não participe da Competição, esse filme merece destaque. É uma incursão por Santiago, Amsterdã, Berlim, Paris, Londres, Porto Alegre e São Paulo. O elo entre as cidades é o gaúcho Caio Fernando Abreu (1948-1996), um dos maiores nomes da literatura brasileira contemporânea. Os lugares são revisitados a partir de fragmentos de suas obras e lembranças de amigos, como a escritora Maria Adelaide Amaral e a cantora Adriana Calcanhoto.
Quando?
Livraria Cultura: dia 05, 23h00
Banco do Brasil: dia 14. 20h00
F. GRACILIANO RAMOS
O dia 27.03.2013 evocou a memória dos sessenta anos da morte do escritor Graciliano Ramos. A data tem sido pretexto para uma série de efemérides em sua homenagem, a principal delas a Festa Literária de Parati, em julho.
Se o velho Graça, como o chamavam os mais próximos, estivesse vivo, provavelmente declinaria de todos os convites. Não aceitaria dar palestras na FLIP, não iria à Feira de Frankfurt (que este ano homenageia o Brasil), não aceitaria convites para aulas magnas, nem compareceria a nenhum programa de entrevistas na TV e muito menos daria declarações a jornais.
A justificativa para tais recusas seria uma só, dada mais ou menos nos seguintes termos: sou um homem da pena, literatura é coisa séria e não cabe a um escritor participar de festas para a promoção de editoras ou responder a questionários mais interessados em curiosidades da vida pessoal.
O LUGAR DE GRACILIANO
A literatura brasileira produziu poucos dramaturgos e poetas de peso. Mas deu vários bons prosadores. E Graciliano é um deles, ombreando com Machado, Guimarães e Clarice. Sua escrita é uma escrita do menos, límpida, sem enfeites. Se o estilo é o homem, como postulou um romancista norte-americano, Graciliano é a encarnação dessa ideia de escritor.
Sua literatura não admite jamais qualquer tipo de concessão. A leitura mais imediata é sempre, como não poderia deixar de ser, a da realidade nordestina, sua paisagem e sua gente, estigmatizadas pela seca e por um conjunto de fatores sociais, políticos e econômicos assentados na desigualdade e na opressão.
Graciliano não panfleta nem discursa. Mostra. Mas com uma contundência capaz de abalar qualquer discurso do status quo. As cenas e quadros montados tornam-se, então, imagens e representações do Brasil. O Nordeste é o país inteiro. Como? Pelo contraste entre os excessos e as privações. Excesso de sol, de luz, de calor, de mandonismo, de concentração da terra, de arrogância, de ignorância. E falta de água, de comida, de terra, de política agrária, de direitos reconhecidos, de humanidade, de candura.
Nesses contrastes, inscreve-se o país contraditório, das possibilidades sempre abortadas, do atraso cuspido entre o discurso e a ação política, das campanhas presidenciais organizadas por marqueteiros, das licitações ilícitas, dos subornos no Congresso Nacional, das deslavadas e relavadas ações de nossos vereadores, deputados e senadores, no momento encabeçadas pelos senhores Marcos Feliciano e Renan Calheiros.
O ESTILO DE GRACILIANO
Mas não se engane, leitor. O tom do parágrafo anterior já se afasta de Graciliano. A indignação, a denúncia, o protesto e a recusa não se dão com essa entonação. Em sua escrita enxuta não afloram adjetivos polvilhados nem substantivos e verbos luminosos. A abertura, a esmo, de qualquer página de seus livros, nos joga num universo de seres “aperreados”, “safados” ou “acanalhados”, vivenciando histórias em que “se embirram”,” se desconcertam”, “se humilham”, onde os “solilóquios” são frequentes e a realidade acontece “animalmente”.
São palavras ásperas que dispensam complementos. Basta reconhecer quem é o emissor e quem é o receptor. Entre o sujeito e o interlocutor, sob a claridade de um sol de fogo, fala o poder e murmura a miséria. Como esta quase não tem voz, entra em cena o narrador. Ouçamo-lo em duas passagens célebres de VIDAS SECAS.
“Iam-se amodorrando e foram despertados por Baleia, que trazia nos dentes um preá. Levantaram-se todos gritando. O menino mais velho esfregou as pálpebras, afastando pedaços de sonho. Sinha Vitória beijava o focinho de Baleia, e como o focinho estava ensanguentado, lambia o sangue e tirava proveito do beijo.
Aquilo era caça bem mesquinha, mas adiaria a morte do grupo.”
A cena narrativo-descritiva elimina análises. O parecer do narrador (“Aquilo…”) é apenas um arremate para sintetizar a situação-limite. Um preá caçado pela cachorra prolongará a vida dos quatro sobreviventes. A cachorra, por sua vez, embora também faminta, oferece o preá à família. E a mãe se contenta em lamber o sangue do rato, ao mesmo tempo em que revela a simbiose entre a família e a cachorra, a diluição dos limites entre homem e natureza. Mas quem articula o sintagma “tirava proveito do beijo” é o narrador, e pelo seu discurso o autor mostra a brutalização do homem e lança ao leitor o questionamento sobre a ordem em que tal sociedade se assenta.
A outra passagem é o desfecho do romance:
“E o sertão continuaria a mandar gente para lá. O sertão mandaria para a cidade homens fortes, brutos, como Fabiano, sinha Vitória e os dois meninos.”
A indicação é nominal: o sertão. O leitor sabe, no entanto, ao término da leitura, que o sertão não é o espaço físico e sim a ordem sócio-político-econômica opressora reinante neste sertão, a cisão entre os que têm a terra e os que não a têm. O discurso do narrador, distanciado, transfere ironicamente para o meio físico a responsabilidade pela desgraça dos retirantes.
Uma ironia, porém muito diferente da ironia machadiana, na qual a reunião dos contrários cria um passo em falso e desvenda a precariedade das representações humanas e de nossas elites escravocratas. Em Graciliano Ramos a ironia guarda uma altivez, como o cacto que preserva sua água. O poder, a propriedade e a arrogância podem desalojar o retirante de muitas fazendas, porém jamais da sua dignidade.
Essa dignidade pulsa, onipresente, no estilo do escritor alagoano. Uma escrita, para lembrar outro grande nome das letras nordestinas, João Cabral, “a palo seco” e “sem restos de janta abaianada“.
GRACILIANO NO CINEMA
Entre as tantas homenagens a Graciliano, o documentarista Sylvio Back (diretor de O CONTESTADO e LOST ZWEIG, entre outros) realizou O UNIVERSO GRACILIANO, filme em que, a partir de depoimentos e imagens de arquivo, reconstitui a trajetória de um dos maiores escritores da língua portuguesa. O filme estreará no 18º É TUDO VERDADE na próxima sexta-feira, 6.abril.
Professor Verô
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